Essa semana eu assisti a um vídeo que me chamou muito a atenção. Uma professora explicava para um grupo de pais sobre a metodologia utilizada por uma escola e citou diversos exemplos de atividades que estavam sendo desenvolvidas com as crianças.
Eis que ela abre um espaço para perguntas e dois pais se manifestaram. Um deles levantou uma preocupação pelo fato da criança comentar em casa sobre situações vividas por ela na escola e que não faziam parte da rotina da casa deles, como cuidar de uma horta, e ele queria saber como lidar com aquilo.
Outra mãe comentou que o filho chegou em casa e falou por diversas vezes que em um dos quartos tinha um monstro. A mãe se sentiu meio perdida para lidar com aquilo, ou seja, como enfrentar o medo da criança frente ao monstro e resolver aquela situação. Estas duas perguntas me fizeram parar para pensar.
Como é grande a distância entre o mundo das crianças e dos adultos. Nascemos com a cabeça livre e a imaginação a mil, e com o passar dos anos sofremos um processo de convergência para o mundo “real”. Temos dificuldades de abstrair as situações, de deixar a criatividade aflorar e entrar no universo imaginário das crianças.
Parece que se não tivermos um guia de boas práticas, ou um passo a passo de “como brincar com uma criança”, ficamos perdidos. Vejo os adultos se tornando vítimas desse amadurecimento que os levaram a acreditar que o concreto sobrepõe ao imaginário, de que existe um único jeito certo de se fazer todas as coisas.
Eu observo os pais levando os filhos na escola, a maioria correndo contra o tempo, espremendo aquele compromisso na hora do almoço. E as crianças? Elas estão querendo conversar, mostrar a flor no chão, o caminhão que está passando na rua, o avião que está no céu. E os pais? “Vamos filho, vamos que já está na hora”. Não está prevista na agenda apertada do dia a contemplação, o andar devagar, a atenção àquilo que foge ao imediatismo.
Porém, vivemos também um paradoxo dentro das empresas: quantas e quantas vezes ouvimos que temos que pensar fora da caixa, que temos que ser inovadores, disruptivos? No entanto, há alguns “poréns” para essa inovação toda acontecer. Ela tem que se encaixar no orçamento, no plano de negócios dos próximos 10 anos, tem que seguir um método, tem que trazer retorno em tanto tempo, tem que passar no crivo do chefe (que muitas vezes não pensa fora da caixa). Enfim, uma ideia tem que ser Highlander e superar diversos obstáculos para que, quem sabe um dia, ela talvez seja implementada.
Ou seja, se a ideia não for tangível, se não tiver como ser medida, logo ela é descartada. Assim é no mundo dos negócios, e ok ser assim, afinal ali o foco é a lucratividade. O problema é pensarmos que a vida fora das empresas precisa ser do mesmo jeito. Não, não precisa ser e na verdade não é, principalmente quando estamos lidando com crianças. Com elas é justamente o contrário, quanto mais simples for, maior será o retorno.
As crianças não buscam a lógica, a racionalidade, o concreto. Elas querem o contato, o interesse, o resolver as coisas juntos, seja enfrentando o monstro no quarto ou observando as flores no jardim no final de semana. Mas como eu vou enfrentar esse monstro? Não sei, cada um tem a sua maneira. Talvez o melhor caminho seja resgatando aquela criança que ficou esquecida dentro de você, e que enfrentou os piores monstros durante o tempo em que esse era o maior problema da sua vida.
Para mim, a lição que essas dúvidas dos pais me trouxeram foi a de que as crianças nos dão uma incrível nova oportunidade de resgatarmos a nossa criança interna e de a colocarmos para brincar com essa que está bem à nossa frente. Não precisamos buscar fora aquilo que está guardado dentro do nós. Basta fazer com que elas se conheçam, se descubram e mais do que tudo, se divirtam. Com o tempo iremos perceber que a leveza das crianças nos tornará adultos mais completos, e quiçá menos complexos.
(O título deste artigo é uma adaptação livre da frase “O Deus que habita em mim saúda o Deus que mora em você”atribuída como significado à saudação Namastê).